Compartilho minha opinião sobre o julgamento da Ação Penal 470. Tentarei publicar o texto num jornal diário de Rio Branco. (MIF)
“INÚTIL, INÚTIL...”
Marcos Inácio Fernandes *
“A
injustiça que se faz a um, é uma ameaça que se faz a todos.”
Montesquieu(1689 – 1755)
“Inútil, inútil...”
Foram as últimas palavras de, John Wilkes Booth, assassino de Abraham Lincoln.
Ouvi-as, na vóz de Paulo Autran, encenando a peça “Liberdade, Liberdade” de
Millôr Fernandes e Flávio Rangel. Eu havia sido presenteado com o disco da peça
por um amigo, jovem revolucionário, José Silton Pinheiro, militante do PCBR,
assassinado pela ditadura militar em 1972. Na época, a peça já havia sido
censurada e, nós a escutávamos, clandestinamente. Ainda conservo o disco e,
mais recentemente, adquiri essa obra em CD, na coletânea que saiu da Nara Leão,
que também trabalhou nesse musical. Eram tempos duríssimos.
Lembrei-me dessa fala
de Booth, agora por ocasião do julgamento da Ação penal 470, que a mídia
popularizou como “mensalão do PT” e, também porque, nesse período, vi um filme do
Robert Redford intitulado: “Conspiração Americana”, que retrata o episódio
histórico do assassinato de Lincoln e o posterior julgamento, por um Tribunal
Militar, dos envolvidos na conspiração do assassinato do Presidente americano.
No filme fica retratado
o clamor popular por vingança, como funciona um tribunal de exceção e, como
também se condena sem provas, apenas por conjecturas e ilações. No filme, a
Mary Surrat, dona de um hotel frequentado pelos conspiradores, entre os quais,
o próprio filho, é defendida pelo advogado, Frederick Diken, herói da guerra
civil, lutando pelo Norte, que é hostilizado por defender uma sulista suspeita
(muito parecido com o que estão fazendo com o Ministro Lewandovski). O advogado
fica convencido da inocência da Mary Surrat e consegue, na undécima hora, um
habeas corpus para suspensão do enforcamento da ré, mas o mesmo é revogado pelo
Presidente Andrew Johnson e se consuma o enforcamento dela e mais 7 homens
suspeitos da conspiração.
Aqui, o linchamento do
latifúndio midiático, já havia “julgado” e condenado José Dirceu, José Genoíno
e Delúbio Soares, o núcleo político do “mensalão” e, por extensão, todo o
Partido dos Trabalhadores. Na sequência, pautaram o Supremo Tribunal Federal –
STF, para realizar o julgamento coincidindo com o processo das eleições
municipais e assim foi feito. Armou-se o circo midiático no STF, com a cobertura
integral do julgamento, chegando ao cúmulo de uma edição do Jornal Nacional, da
Rede Globo, dedicar 18 minutos, nesse horário nobre e, as vésperas da eleição,
a pretexto de fazer um balanço do julgamento, que ainda não havia sido
concluído. Fizeram o que puderam. O possível e o impossível, para que o
julgamento influenciasse nas eleições, como o próprio Procurador, que segundo o Senador Collor de Melo é prevaricador e vazador de informações sigilosas à revista Veja, verbalizou em entrevista à imprensa.
Inúti, inútil ! A
coalisão de direita do PIG (Partido da Imprensa Golpista), junto com o STF e a
oposição partidária (PSDB, DEM, PPS), fizeram tudo certinho bem sincronizado,
porém, (e sempre há um porém), esqueceram-se de “combinar com os russos”
(como diria o Anjo das pernas tortas). Os russos no caso – o povo brasileiro.
Encerradas as eleições e apuradas as urnas, para espanto e desgosto desse
contubérnio jurídico/midiático, o Partido dos Trabalhadores emerge do processo
eleitoral como o grande vitorioso. Os números são insofismáveis: o PT contabilizou
27 milhões de votos, sendo o campeão de votos; ganhou o maior número de
Prefeitura do G-85 (grupo de cidades com mais de 200 mil eleitores, incluindo
as 26 capitais), ficando com 16 dessas cidades e, entre elas a nossa Rio Branco
e a metrópole de São Paulo (o “poste” lançado por Lula, Fernando Haddad, que
nunca havia disputado uma eleição, derrotou o eterno candidato da oposição,
José Serra). Tem mais: O PT elegeu 5.146 vereadores, um aumento em relação a
2008, de 22%, enquanto que a oposição do PSDB,(5.897 vereadores) teve uma queda
de 13% e o DEM (4.801 vereadores)teve a queda mais acentuada de 33% e o aliado
PMDB, que fez o maior número de vereadores (7.825), também teve uma queda em
relação a 2008, de 8%. Em síntese, em 2013, o PT vai governar para um maior
número de cidadãos e vai administrar o maior orçamento, entre os grande
partidos. O PT, só perdeu na bancada do Jornal Nacional e nos editoriais de O
Globo. E no Supremo.
Diz-se que sentença
judicial, principalmente do Supremo (que tem o direito e a prerrogativa de
“errar por último”), não se discute, cumpre-se. Cumpriremos a pena (pois todos
nós do PT, também fomos criminalizados e sentenciados nesse processo),
entretanto, não pudemos nos calar diante das injustiças, que fluíram aos
borbotões desse julgamento. Foi um tribunal de exceção, com dois pesos e duas
medidas no tratamento dos dois “mensalões” (o do PSDB e o do PT); Juízes
falando fora dos Autos; Magistrados fazendo deboche e emitindo juízos de valor
depreciativos contra o PT e a política (teve um, inclusive, que o ex ministro
da Justiça, Saulo Ramos, conhece muito bem, no seu voto condenatório, chegou a
comparar o PT com o Comando Vermelho e o PCC); porém, o mais grave, foi a
criação de uma jurisprudência nova do “Domínio do fato” para condenarem Dirceu
e Genoíno, já que as provas apresentadas pelo Procurador, agora arrolado na CPMI do Cachoeira, eram “tênues”.
Condenaram sem provas consistentes e, a partir de uma decisão dessa
envergadura, da mais alta Corte do país, cria-se uma insegurança jurídica e a
certeza de que a justiça do Brasil que, pelo seu caráter de classe, apenas
condenava POBRES, PRETOS E PROSTITUTAS, agora coloca outro “P” de PETISTAS, no
seu seletivo rol dos infratores. Nós, petistas, estamos todos ameaçados.
Agora o alvo é Lula,
depois a Presidenta Dilma e, quem sabe se num futuro não muito distante, O
Supremo não peça a cassação do PT. Lembremo-nos, que há precedentes, pois já
fizeram isso com o Partidão (PCB) em 1946.
É importante continuarmos
a acreditar na política e fazermos o trabalho partidário organizativo junto ao
povo. Esse povo, que o historiador Manoel Bonfim disse que: “sempre
serviu aos poderosos, ou como jagunço, ou como soldado, ou como eleitor”, rompeu
essa sina e deixou de servir aos poderosos desde 2002 e, na última eleição, não
se deixou engabelar pela “opinião publicada” e nos fez justiça nas urnas.
A propósito e, para
encerrar, um poema de Bertolt Brechet, que trata desse assunto: “A
justiça é o pão do povo. / Quando o pão é pouco, há fome/Quando o pão é ruim,
há descontentamento./ Fora com a justiça ruim / Cozida sem amor, amassada sem
arte./Justiça sem tempero de casca pardacenta/ou justiça dormida que vem tarde
demais./(...) Tão necessária quanto o pão de cada dia,/ É necessária a justiça de cada dia./Sendo o pão da justiça
tão importante/ Quem, amigos, deve prepará-lo?/Quem prepara o outro pão?/ assim
como o outro pão/Deve o pão da justiça/Ser preparado pelo povo / Bastante,
saudável, diário”
Aguardamos, com
serenidade, o julgamento soberano do povo e da história.
*Marcos Inácio
Fernandes é professor aposentado da UFAC e militante do PT.
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