quarta-feira, 21 de novembro de 2012

INÚTIL, INÚTI...

Compartilho minha opinião sobre o julgamento da Ação Penal 470. Tentarei publicar o texto num jornal diário de Rio Branco. (MIF)

“INÚTIL, INÚTIL...”
Marcos Inácio Fernandes *

“A injustiça que se faz a um, é uma ameaça que se faz a todos.” 
                                                        Montesquieu(1689 – 1755)

“Inútil, inútil...” Foram as últimas palavras de, John Wilkes Booth, assassino de Abraham Lincoln. Ouvi-as, na vóz de Paulo Autran, encenando a peça “Liberdade, Liberdade” de Millôr Fernandes e Flávio Rangel. Eu havia sido presenteado com o disco da peça por um amigo, jovem revolucionário, José Silton Pinheiro, militante do PCBR, assassinado pela ditadura militar em 1972. Na época, a peça já havia sido censurada e, nós a escutávamos, clandestinamente. Ainda conservo o disco e, mais recentemente, adquiri essa obra em CD, na coletânea que saiu da Nara Leão, que também trabalhou nesse musical. Eram tempos duríssimos.
Lembrei-me dessa fala de Booth, agora por ocasião do julgamento da Ação penal 470, que a mídia popularizou como “mensalão do PT” e, também porque, nesse período, vi um filme do Robert Redford intitulado: “Conspiração Americana”, que retrata o episódio histórico do assassinato de Lincoln e o posterior julgamento, por um Tribunal Militar, dos envolvidos na conspiração do assassinato do Presidente americano.
No filme fica retratado o clamor popular por vingança, como funciona um tribunal de exceção e, como também se condena sem provas, apenas por conjecturas e ilações. No filme, a Mary Surrat, dona de um hotel frequentado pelos conspiradores, entre os quais, o próprio filho, é defendida pelo advogado, Frederick Diken, herói da guerra civil, lutando pelo Norte, que é hostilizado por defender uma sulista suspeita (muito parecido com o que estão fazendo com o Ministro Lewandovski). O advogado fica convencido da inocência da Mary Surrat e consegue, na undécima hora, um habeas corpus para suspensão do enforcamento da ré, mas o mesmo é revogado pelo Presidente Andrew Johnson e se consuma o enforcamento dela e mais 7 homens suspeitos da conspiração.
Aqui, o linchamento do latifúndio midiático, já havia “julgado” e condenado José Dirceu, José Genoíno e Delúbio Soares, o núcleo político do “mensalão” e, por extensão, todo o Partido dos Trabalhadores. Na sequência, pautaram o Supremo Tribunal Federal – STF, para realizar o julgamento coincidindo com o processo das eleições municipais e assim foi feito. Armou-se o circo midiático no STF, com a cobertura integral do julgamento, chegando ao cúmulo de uma edição do Jornal Nacional, da Rede Globo, dedicar 18 minutos, nesse horário nobre e, as vésperas da eleição, a pretexto de fazer um balanço do julgamento, que ainda não havia sido concluído. Fizeram o que puderam. O possível e o impossível, para que o julgamento influenciasse nas eleições, como o próprio Procurador, que segundo o Senador Collor de Melo é prevaricador e vazador de informações sigilosas à revista Veja, verbalizou em entrevista à imprensa.
Inúti, inútil ! A coalisão de direita do PIG (Partido da Imprensa Golpista), junto com o STF e a oposição partidária (PSDB, DEM, PPS), fizeram tudo certinho bem sincronizado, porém, (e sempre há um porém),  esqueceram-se de “combinar com os russos” (como diria o Anjo das pernas tortas). Os russos no caso – o povo brasileiro. Encerradas as eleições e apuradas as urnas, para espanto e desgosto desse contubérnio jurídico/midiático, o Partido dos Trabalhadores emerge do processo eleitoral como o grande vitorioso. Os números são insofismáveis: o PT contabilizou 27 milhões de votos, sendo o campeão de votos; ganhou o maior número de Prefeitura do G-85 (grupo de cidades com mais de 200 mil eleitores, incluindo as 26 capitais), ficando com 16 dessas cidades e, entre elas a nossa Rio Branco e a metrópole de São Paulo (o “poste” lançado por Lula, Fernando Haddad, que nunca havia disputado uma eleição, derrotou o eterno candidato da oposição, José Serra). Tem mais: O PT elegeu 5.146 vereadores, um aumento em relação a 2008, de 22%, enquanto que a oposição do PSDB,(5.897 vereadores) teve uma queda de 13% e o DEM (4.801 vereadores)teve a queda mais acentuada de 33% e o aliado PMDB, que fez o maior número de vereadores (7.825), também teve uma queda em relação a 2008, de 8%. Em síntese, em 2013, o PT vai governar para um maior número de cidadãos e vai administrar o maior orçamento, entre os grande partidos. O PT, só perdeu na bancada do Jornal Nacional e nos editoriais de O Globo. E no Supremo.
Diz-se que sentença judicial, principalmente do Supremo (que tem o direito e a prerrogativa de “errar por último”), não se discute, cumpre-se. Cumpriremos a pena (pois todos nós do PT, também fomos criminalizados e sentenciados nesse processo), entretanto, não pudemos nos calar diante das injustiças, que fluíram aos borbotões desse julgamento. Foi um tribunal de exceção, com dois pesos e duas medidas no tratamento dos dois “mensalões” (o do PSDB e o do PT); Juízes falando fora dos Autos; Magistrados fazendo deboche e emitindo juízos de valor depreciativos contra o PT e a política (teve um, inclusive, que o ex ministro da Justiça, Saulo Ramos, conhece muito bem, no seu voto condenatório, chegou a comparar o PT com o Comando Vermelho e o PCC); porém, o mais grave, foi a criação de uma jurisprudência nova do “Domínio do fato” para condenarem Dirceu e Genoíno, já que as provas apresentadas pelo Procurador, agora arrolado  na CPMI do Cachoeira, eram “tênues”. Condenaram sem provas consistentes e, a partir de uma decisão dessa envergadura, da mais alta Corte do país, cria-se uma insegurança jurídica e a certeza de que a justiça do Brasil que, pelo seu caráter de classe, apenas condenava POBRES, PRETOS E PROSTITUTAS, agora coloca outro “P” de PETISTAS, no seu seletivo rol dos infratores. Nós, petistas, estamos todos ameaçados.
Agora o alvo é Lula, depois a Presidenta Dilma e, quem sabe se num futuro não muito distante, O Supremo não peça a cassação do PT. Lembremo-nos, que há precedentes, pois já fizeram isso com o Partidão (PCB) em 1946.
É importante continuarmos a acreditar na política e fazermos o trabalho partidário organizativo junto ao povo. Esse povo, que o historiador Manoel Bonfim disse que: “sempre serviu aos poderosos, ou como jagunço, ou como soldado, ou como eleitor”, rompeu essa sina e deixou de servir aos poderosos desde 2002 e, na última eleição, não se deixou engabelar pela “opinião publicada” e nos fez justiça nas urnas.
A propósito e, para encerrar, um poema de Bertolt Brechet, que trata desse assunto: “A justiça é o pão do povo. / Quando o pão é pouco, há fome/Quando o pão é ruim, há descontentamento./ Fora com a justiça ruim / Cozida sem amor, amassada sem arte./Justiça sem tempero de casca pardacenta/ou justiça dormida que vem tarde demais./(...) Tão necessária quanto o pão de cada dia,/ É necessária  a justiça de cada dia./Sendo o pão da justiça tão importante/ Quem, amigos, deve prepará-lo?/Quem prepara o outro pão?/ assim como o outro pão/Deve o pão da justiça/Ser preparado pelo povo / Bastante, saudável, diário”
Aguardamos, com serenidade, o julgamento soberano do povo e da história.


*Marcos Inácio Fernandes é professor aposentado da UFAC e militante do PT.

Nenhum comentário: