Pinçado do Blog "De Esquerda em Esquerda" do Rudá Ricce. Entrevista com o autor.
quinta-feira, 7 de junho de 2012. Entrevista ao jornal Identidade, do Centro Universitário Metodista Izabela Hendrix
1) Como se explica o fato dos brasileiros não lembrarem em quem votaram nas últimas eleições?
R: Vamos começar pelo conceito de memória. Maurice Halbwachs sugere que toda memória está inserida num contexto grupal, família, comunidade próxima. Ela pode ser um flash, quando ouvimos uma música ou sentimos um aroma que nos remete à uma avó; ou pode ser ideológica, quando criamos uma interpretação a um fato vivido e que reinterpretamos á luz do que vivemos hoje. A memória é construída socialmente (ou na relação social) e sem a presença do outro ela permanece como um dado encostado, sem uso.
Ora, a grande maioria dos eleitos no Brasil não reaparecem nos locais em que pediu votos. Priorizam seus pares ou a grande imprensa. Por outro lado, a vida política está apartada da vida cotidiana. Em outras palavras, não há relação direta entre direito, país e política em nosso país. Somos, neste sentido, uma sociedade dual, onde a vida política decide, e os eleitores apenas confirmam os interesses de quem quer subir para esta escala social. Não há relação de representação ou espelhamento (representação é espelho social).
2) Analise as influências que as pessoas sofrem na hora de escolher o candidato. Fizemos uma enquete com eleitores e em várias respostas apareceu o dado de que os eleitores desejam melhorias baseadas em suas necessidades particulares. Como interpretar esta situação?
R: É uma situação básica da relação política. Primária. As necessidades são individuais; os interesses são coletivos e somente os direitos são universais. A situação de relacionar uma necessidade imediata com a política reafirma minha primeira resposta. No Brasil, a política não gera noção de direito, de algo vinculado à humanidade. Relaciona-se com comércio. E não é apenas do eleitor com o candidato, mas é a base da relação entre eleitos, governantes e parlamentares. É o fundamento do patrimonialismo. Sem um sistema político efetivamente representativo, que o mandato fica preso às intenções do eleitor, não há como superarmos esta relação primária.
3) Por que os candidatos sempre propõem melhorias nas mesmas questões? E se estas são as reivindicações da população por que não percebemos melhorias nessas áreas?
R: Porque os candidatos visam sua eleição e não a melhoria de vida da população. Elaboram plano de campanha e não estratégias de desenvolvimento. Acompanhe como uma campanha está sendo planejada para este ano eleitoral. Perceberá que o candidato estuda seu público-alvo, os gastos que deverá realizar, os apoiadores que terá que conquistar e pede, quase em súplica, para alguém formular um slogan de campanha e um discurso básico. Nada mais que isto.
4) Qual sua análise sobre o caso de famílias que revezam seus membros no poder?
R: É a base do patrimonialismo brasileiro. E se renova. Veja ACM Neto, na Bahia; Rodrigo Mais, no Rio de Janeiro; Rodrigo de Castro, em Minas Gerais; Aécio Neves e tantos outros. Formam-se dinastias ou tentativas de formação de dinastias. O que revela que política tem um custo alto e aqueles que conseguem chegar ao poder, acabam por utilizá-lo como meio de se diferenciar dos concorrentes. Em outras palavras, quem já atingiu certo nível de poder, utiliza todos recursos decorrentes desta situação para sair à frente de concorrentes ou barrar o surgimento de nova liderança. A renovação política, assim, é estética porque se alteram os semblantes, mas os objetivos e negócios familiares continuam presentes. Veja, mais uma vez, que esta lógica rompe com qualquer possibilidade de representação efetiva. O voto não elege um representante de seu interesse, mas um representante do clã de origem do candidato.
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